Já faz mais de 50 anos desde que o homem pôs os pés na Lua pela primeira vez, mas mesmo assim imaginar uma missão espacial tão ambiciosa ainda parece uma história fantástica, ou um sonho de criança. Não à toa é tão prazeroso assistir a realização de Fei Fei ao conseguir fazer sua nave improvisada decolar no trailer da nova animação da Netflix, A Caminho da Lua. A estreia acontece na sexta-feira, dia 23 de outubro.
No seu primeiro projeto fora da Disney, o animador veterano Glen Keane, conhecido por seus trabalhos em A Pequena Sereia e A Bela e a Fera, novamente se propõe a acompanhar uma personagem disposta a provar que o impossível é possível. Dessa vez, porém, através dos olhos de uma criança que deseja se reconectar com sua falecida mãe. Para cumprir seu objetivo, Fei Fei acredita que precisa partir para uma aventura mágica e pedir a ajuda da lendária deusa Chang’e, que mora no lado sombrio da Lua. Veja:
São muitas as histórias da entidade que inspirou A Caminho da Lua. Uma das mais populares conta que ela recebeu do seu amado, o guerreiro Houyi, um elixir que garantiria sua imortalidade, uma recompensa que ele ganhou em uma das suas missões épicas. Ele não queria bebê-lo, porque isso significaria eventualmente levar uma vida sem Chang’e. Ele, então, se limitou a entregá-lo à deusa para que ela o protegesse. Certo dia, porém, um homem tentou roubá-lo e, para garantir que o ladrão jamais colocaria suas mãos no elixir, Chang’e o tomou e se exilou na Lua, torcendo para que um dia pudesse se reencontrar com seu amor.
Talvez você nunca tenha ouvido falar nessa figura mítica e misteriosa, mas Chang’e é muito famosa na China. “Lá ela é maior que o Papai Noel”, afirmou a produtora Peilin Chou que, assim como Fei Fei, também adorava a deusa quando pequena. “Cresci acreditando na lenda de Chang’e e a celebrando todos os anos no feriado, no gramado com a minha família. Olhava para a Lua e a buscava. Todo ano eu estava certa de que conseguia vê-la”.
Como uma figura tão presente no imaginário chinês, não é de se surpreender que uma garotinha como Fei Fei fosse tão encantada por Chang’e e sonhasse em um dia encontrá-la. No entanto, a lenda representa muito mais do que apenas um conto fascinante para a pequena. Em alguma medida, a história de Chang’e e Houyi se mistura com o romance dos seus próprios pais, que também eram perdidamente apaixonados até que um evento repentino interrompeu suas trajetórias: a morte da mãe de Fei Fei.
Por isso, quando o pai anuncia, anos depois, que pretende se casar novamente, Fei Fei sente seu mundo ruindo novamente. A ideia de ir para a Lua atrás de Chang’e parece ser a única maneira possível de provar para o pai que, sim, o amor é eterno e, assim, talvez “salvar” sua família.
“Fei Fei é uma mistura real dos seus pais”, explica Keane sobre as origens do plano da pequena heroína. “Seu pai vê as coisas de um jeito muito prático e científico, e Fei Fei é incrivelmente inteligente. Ela também é como a mãe, que tem essa imaginação tão forte. Juntas, essas duas características a inspiram a construir um foguete para a Lua”.
Quando realidade e ficção se misturam
O paralelo entre o mito e a vida de Fei Fei por si só é bastante interessante. No entanto, A Caminho da Lua é, de certa forma, ainda uma metáfora para história da sua roteirista, Audrey Wells, que embarcou no projeto quando já estava severamente doente.
“Quando apresentamos a ideia inicial para ela [Wells] sobre essa garotinha que decide construir um foguete para a Lua, ela se empolgou tanto com a personagem, que ama ciência”, explicou a produtora Peilin Chou. “Mas, além disso, ela realmente se conectou com a história que ela mesma estava vivendo”.
Wells tinha pouco tempo de vida, fato que só abriu para a equipe quando o projeto já estava há um ano em desenvolvimento. “Ela realmente queria deixar esse filme como uma carta de amor para sua filha e seu marido para falar sobre o que acontece quando alguém morre e como o amor dura para sempre”. A roteirista faleceu em 2018, mas chegou a assistir à primeira versão de A Caminho da Lua. “Ela absolutamente amou. Ficou tão contente”, disse Chou.
Criando Fei Fei e Lunaria
Para o diretor Glen Keane, a lição por detrás de A Caminho da Lua é abrace as mudanças, uma ideia fundamental para qualquer projeto, mas sobretudo em um momento de pandemia como o atual, que obriga todo mundo a repensar métodos e ideias – inclusive a equipe deste filme. No entanto, isso também faz parte do próprio processo criativo de Keane quando ele vai criar suas personagens.
“Tenho essa crença estranha que, quando você está criando um personagem, eles já existem antes mesmo de você começar a desenhá-lo”, contou o animador, enquanto desenhava sua protagonista para os jornalistas em um evento virtual. “E aí surge o processo de experimentação. Você olha para o desenho e alguém te pergunta: ‘ah, então essa é a Fei Fei?’. E você diz ‘não, ainda não’. Até que de repente o desenho surge e você nota que Fei Fei está te encarando. É ela”.
Ainda que seu visual tenha personalidade, é difícil não reparar nas semelhanças entre Fei Fei e Yi, a protagonista de Abominável. Também produzida pelo Pearl Studio, a personagem da animação da DreamWorks parece uma versão mais velha de Fei Fei, que cresceu e manteve o cabelo curto e o gosto pela combinação de shorts e meia calça. Aliás, este não é o único paralelo entre as duas obras. Além de serem ambientadas na China moderna e terem criaturas mitológicas (um yeti e uma deusa) no centro da trama, ambas falam sobre meninas que perderam um dos pais muito cedo e lidam com o luto durante uma jornada fantástica. As duas ainda são acompanhadas por garotinhos elétricos (o vizinho de Yi e o irmãozinho de Fei Fei) e aprendem lições sobre superação ao longo dos filmes. E, à primeira vista, o novo lançamento da Netflix parece também não ter muitas texturas.
O diferencial visual de A Caminho da Lua está mesmo no seu retrato da Lua. O pouco que foi revelado do lar de Chang’e, isto é, Lunaria, mostra um mundo colorido, pulsante e possivelmente até um pouco frito. A principal inspiração não poderia ser mais adequada: a capa do Dark Side of the Moon, do Pink Floyd. A ideia de Glen Keane era criar um lugar que fosse tão icônico quanto a arte do disco de 1973. Só nos resta esperar o lançamento do longa para saber se a missão foi cumprida.
fonte: Omelete